sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

-'Sobre os Deuses e o Cosmos' por Flavius Sallustius

{"Sobre os Deuses e o Cosmos" trata-se de um livro de vinte e uma clausula ou ensinamentos da antiga Roma, criado pelo filósofo e bruxo Flavius Sallustius no período em que as academias e templos pagãos foram proibidos e, os Iniciados e Filósofos da clássica Arte dos Sábios ou Bruxaria, foram alguns perseguidos e, outros, obrigados a fugirem para a corte sassânida do Império Persa, devido à perseguição Cristã aos adeptos das antigas religiões, como Sospatros e Hypatia; além disso, o livro é antigo, mas, por outro lado, como foi criado para orientar os iniciantes e aprendizes em academias ou colégios de círculo externo ante-conventicular, sempre inspirou os buscadores do graal e aspirantes à iniciação na Bruxaria}.





Sobre os Deuses e o Cosmos 
(por Flavius Sallustius)

“Pois estaremos sempre com você, em qualquer lugar, Eu [o Deus Apollon], [a Virgem arcanja] Atena e [o Arcanjo Fundador da Bruxaria ou Arte dos Sábios] Hermes, e conosco todos os Deuses que estão no Olimpo e os daimones do ar e da terra, e todas as formas da divindade em qualquer lugar, enquanto você estiver conosco, sendo leal a seus amigos e benevolente com seus irmãos e iniciados, liderando e guiando-os para o bem. Nunca se renda às suas vaidades ou às deles”.

(Discurso incorporado de Flavius Claudius Iulianus à Heracleios).


I - O Que o Iniciado Deve Ser e Sobre as Concepções Comuns:

Aqueles que desejam ouvir sobre os Deuses devem ser bem guiados desde a infância e não ser habituados a crenças falsas. Devem, também, estar em boa disposição e sensatos, para que possam adequadamente aprender os ensinamentos. Além disso, devem conhecer acerca de concepções comuns. As concepções comuns são aquelas com as quais todas as pessoas concordam assim que ouvem ou aprendem: por exemplo, que toda divindade é boa ou melhor; se for para o pior, é feita inferior; se para o melhor, deveria ter sido inferior antes.

II Que Toda Divindade é Imutável, Não Gerada, Eterna, Incorpórea e Inexiste no Espaço:

Deixe que o Iniciado assim seja. Deixe os ensinamentos serem do seguinte modo. As essências dos Deuses nunca vieram à existência, pois, aquilo que sempre é, nunca vem à existência, e aquilo que existe para sempre, possui força primária e por natureza não sofre nada: e consistem de corpos [não físicos], pois, mesmo em corpos, os poderes são incorpóreos; nem estão contidos no espaço, pois, isso é uma propriedade de corpos; nem estão separados da prima causa, nem do Uno ao outro, assim como os pensamentos não estão separados da mente, nem atos de conhecimento da alma.

III – Sobre os Mitos e Por Que São Divinos:

Podemos muito bem perguntar, então, por que os antigos renunciaram essas doutrinas e fizeram uso de mitos, a que temos que buscar e não deixar as nossas mentes desocupadas. O fato dos mitos serem divinos pode ser observado através daqueles que os usaram. Os mitos foram usados por poetas ou menestréis inspirados, pelos melhores filósofos, por aqueles que estabeleceram a Arte dos Sábios ou Mistérios e pelos próprios Deuses nas divinações. Mas o motivo dos mitos serem divinos é dever da filosofia investigar. Já que todas as coisas existentes se regozijam no que lhes é similar e rejeitam o que não lhes é similar, as histórias sobre os Deuses devem ser como os Deuses, assim elas podem ser dignas da essência divina e tornar os Deuses bem dispostos àqueles que deles falam: o que poderia ser feito apenas por meio de mitos.

Assim sendo, os mitos representam os próprios Deuses e a sua benevolência – sujeita sempre à distinção do dizível e do indizível, o revelado e o não revelado, o que é claro e o que é oculto: já que, assim como os Deuses fizeram os bens das sensações comuns a todos, mas aqueles do intelecto apenas aos Sábios, então os mitos afirmam a existência dos Deuses para todos, mas quem e o que eles são apenas para aqueles capazes de entender. Eles também representam as atividades dos Deuses. Pois, pode-se chamar o mundo de um mito, no qual corpos e coisas são visíveis, mas as almas e mentes estão ocultas.

Também, o desejo de ensinar a todos a verdade completa sobre os Deuses produz repúdio nos tolos, pois, eles não podem entender e não possuem zelo pelo que é bom, enquanto que, ocultar a verdade através de mitos, previne o repúdio do tolo e fortalece os benevolentes a praticar a filosofia. Mas por que os mitos contam histórias de adultério, roubos, patricídio e todos os demais absurdos? Não seria, talvez, algo digno de admiração, feito assim para que, por meio do visível absurdo, a alma possa imediatamente sentir que as palavras sejam véus e que acredite que a verdade seja um mistério?

IV – Que as Espécies de Mito são Cinco e seus Exemplos Cada:

Alguns mitos são teológicos, alguns naturais, alguns psíquicos e, mais uma vez, alguns são materiais e alguns misturam os últimos dois. Os teológicos são aqueles que não usam forma física, mas contemplam a verdadeira essência dos Deuses: por exemplo, Khronos devorando seus filhos. Como os Deuses são inteligíveis e todo intelecto retorna a si mesmo, esse mito expressa em alegoria a essência do Deus. Mitos podem ser encarados fisicamente quando expressam as atividades dos Deuses no mundo: por exemplo, as pessoas antigamente viam Khronos como o tempo e chamavam as divisões do tempo como os filhos de que eram devorados pelo pai. Os psíquicos se pautam em ver as atividades da própria alma, o ato de pensar da alma, apesar de que este passa a outros objetos, não obstante, permanece dentro de seu progenitor.

A forma material e última é a de que os egípcios têm mais usado, devido seu desconhecimento, crendo que objetos materiais fossem realmente Deuses e, assim, chamando-os, por exemplo, a terra de [Deusa] Isis, a umidade de [Deus] Osiris, o calor de [demiurgos Tubalcain ou] Typhaon, ou ainda, a água de [rei] Khronos, os frutos da terra de [Filho Divino] Adonis e o vinho de [Deus] Dionizius. Afirmar que esses são objetos sagrados aos Deuses, como muitas ervas, pedras e animais, é possível para homens sensatos, porém, afirmar que estes objetos são Deuses é noção de loucos, a não ser, talvez, no sentido no qual tanto a orbe do Sol como o raio que vem da orbe sejam coloquialmente chamados de “O Sol” ou “O Helios” [isto é, não no sentido de sol físico, mas, no sentido de "Sol da Verdade", o Sol Oculto ou Sol Negro, Sirius]. A forma misturada de mito pode ser observada em muitos casos: por exemplo, quando dizem que, em um banquete dos Deuses, a Discordia [Eris] jogou uma maça dourada; os Deuses disputaram por ela e foram enviados por Zeus até Paris, para serem julgadas.

Paris avistou [a Naamah/Ninmah/Niamh a Aphrodite Pandemos/Syria Kale/Sarah Kali] Aphrodite como a mais bela e deu-lhe a maça ou pomo. Aqui o banquete significa os poderes sobrenaturais dos Deuses, motivo pelo qual Eles estão todos juntos. O pomo ou maça dourada metaforiza o mundo, o qual, sendo formado de opostos [e mesclas, segundo a filosofia do Clã Socrático-platônico], é naturalmente “atirado pela Discordia”. Os diferentes Deuses concedem diferentes dons ao mundo e, desta forma, afirma-se que “disputam pela maça ou pomo”. E a alma que vive de acordo com os sentidos sensoriais, pois é o que Paris representa, não vendo os outros poderes no mundo, apenas a beleza, declara que a maça ou pomo pertence à Aphrodite. Mitos teológicos satisfazem filósofos, mitos naturais e psíquicos satisfazem poetas e, estes tipos de mitos misturados, satisfazem Iniciação religiosa, pois, cada iniciação busca nos unir com o mundo e os Deuses.

Usando um outro mito, dizem que a Mãe dos Deuses [Rhea, a Nuit], vendo Attis [o Filho Divino] deitado à margem do rio Gallus, sentiu amor por Ele, tomou-O, coroou-lhe com o seu chapéu de estrelas e, depois disso, manteve-o intimamente junto a Ela. Ele sentiu amor por uma ninfa [vide: mito do Filho Divino Eros e de sua amante mortal Psyche, também descritos no Apócrifo de Maria Madalena] e deixou a Mãe para viver com ela. Por isso, a Mãe dos Deuses fez Attis enlouquecer e cortar seus testículos, deixá-los com a ninfa e retornar para viver junto a Ela. Logo, a Mãe dos Deuses é o princípio que gera a vida, motivo pelo qual é chamada de Mãe. Attis é o criador de todas as coisas que nascem e morrem, por isso Ele é encontrado à margem do rio Gallus, pois, Gallus significa Galáxia ou Via Láctea, o ponto em que o corpo começa a ficar sujeito às paixões. Assim, como os Deuses primários fazem perfeitos os secundários, a Mãe ama Attis e dá-lhe poderes celestiais.

É o que o chapéu significa. Attis ama uma ninfa: as ninfas [seres elementais da água ou fadas, presentes durante os ritos sagrados da Bruxaria] presidem sobre a geração, já que tudo que é gerado é fluido. Mas como o processo de geração deve ser parado em algum ponto e não permitido que se gere algo pior que o pior, o criador que faz todas essas coisas arranca de si os seus poderes gerativos para dentro da criação e retorna aos Deuses de novo. Logo, tais coisas nunca aconteceram, mas sempre são. E a mente vê todas as coisas de uma vez, mas a razão [plano mental] expressa algumas coisas primeiro e, outras, depois [plano astral]. Assim, o mito está de acordo com o cosmos e, por isso, mantemos um festival que imita o cosmos, pois, como poderíamos alcançar maior ordem? E nós mesmos, primeiramente, tendo caído dos céus e vivendo com as ninfas [as Fadas, elementais da água], estamos abatidos e nos abstemos de milho e de todas as comidas ricas e impuras, pois, são prejudiciais à saúde da alma.

Então, vem o corte da árvore e o jejum [no Sabá invernal ou natalino, chamado de Hilária na velha Bruxaria], como se estivéssemos também cortando o processo de geração [após tornarmos Santos ou Heróis]. Depois disso, a alimentação com leite, como se estivéssemos nascendo de novo, e então vêm os júbilos e as guirlandas, como se fosse um retorno aos Deuses. A estação do ritual é a evidência da verdade dessas explicações. Os ritos são realizados por volta do Equinócio de Primavera, quando as frutas da terra estão deixando de serem produzidas e o dia está se tornando mais longo que a noite, o que se aplica bem a espírito ascendendo aos planos mais altos. Pelo menos, o outro Equinócio é, no estudo dos mitos, o momento do estupro de Kore [a Persephone/Lilith que, assim como a superior Metis e a intermediária Hera/Ashera, era uma das Shekhinah/Cárites/Ideias do Altíssimo que, após ser materializada por Tubalcain/Hephaistos segundo a ordem do Altíssimo, ganhou o nome de Havah ou Pandora/Tefenet, a Matriarca da raça humana feminina], que é a descida das almas.

V – Sobre a Causa Prima:

Seguindo na ordem, vem o conhecimento da primeira causa e das ordens subsequentes dos Deuses, da natureza do mundo, da essência do intelecto e da alma. Devemos, também, refletir sobre a Providência, o Destino e a Fortuna e sobre as coisas boas e más que delas procedem. E, finalmente, devemos especular de qual fonte o mal veio ao mundo. Cada um desses assuntos, precisa de longas discussões, mas, talvez, não haja problemas em apresentá-los brevemente, para que o Iniciado não seja ignorante sobre isso. É necessário, então, que a causa prima seja uma – pois, a unidade precede a multiplicidade – e supere todas as coisas em poder e benevolência. Consequentemente, todas as coisas devem tomar parte da sua natureza. Pois, nada pode impedir as suas energias através de poder e, devido à sua benevolência, nada irá separar.

Se a causa prima fosse alma, todas as coisas possuiriam alma. Se fosse mente, todas as coisas possuiriam mente. Se fosse o ser, todas as coisas partilhariam do ser. E vendo esta qualidade em todas as coisas, alguns homens pensaram que era o ser. No entanto, se as coisas simplesmente fossem, sem serem boas, esse argumento seria verdadeiro, mas, se as coisas que são as são por causa de sua bondade e partilham da benevolência, a causa prima deve estar tanto além do ser quanto além da benevolência. Uma forte evidência disso é que as almas nobres desprezam o seu ser em defesa da benevolência, quanto encaram a morte pela sua pátria, pelos seus amigos ou pelo bem virtuoso ou da excelência. Depois desse poder inexprimível, as ordens dos Deuses sucedem.

VI – Sobre os Deuses da Natureza e Sobrenaturais:

Alguns Deuses são naturais, da natureza, e alguns acima da natureza, sobrenaturais. Por naturais quero dizer aqueles que engendram a natureza. Por sobrenaturais, os Deuses que criam a essência, alguns a mente e alguns a alma. Assim, Eles possuem três ordens, todas as quais podem ser encontrados tratados a respeito. Alguns dos Deuses naturais criam o mundo do ser, outros o animam, outros o harmonizam, constituindo de diferentes elementos, a quarta classe o mantém quando harmonizado.

Essas são as quatro ações, cada uma delas possui um começo, meio e fim, consequentemente deve haver doze Deuses regendo o mundo. Aqueles que fazem o mundo, são Zeus [o "Altíssimo"], Poseidon [o Deus que toma forma de Touro de Creta para salvar a Deusa Demeter Europa/Euryphaessa] e Hephaistos [o demiurgos ou arquiteto do mundo]; aqueles que o animam, são Demeter [a Deusa Mãe], Hera [a Cárite/Ideia do Altíssimo] e Artemis [a Deusa Virgem Mãe]; aqueles que o harmonizam, são Apollon [o Deus Cornífero do período vernal], Athena [a dama Sophia/Iris, mãe celestial de Hermes] e Ares [Ahriman/Seth, o terrível cavaleiro sanguinário da Atlântida e que, junto ao "Altíssimo", traiu o anjo Tubalcain]. Pode-se ver sugestões ocultas nas suas imagens. Apollon afina uma lira [a sinfonia ou melodia emanada pelas estrelas, que inspira os poetas e santos]; Atena está com uma lança [símbolo fálico da entrada para a vida adulta e para a participação política, também chamada de Égide ou Paládio]; Aphrodite está nua (porque a harmonia cria beleza e a beleza, somente poder-se-á ver ou apreciar, em coisas visíveis ou não ocultadas).

Enquanto esses doze Deuses, no sentido primário, possuem o mundo, devemos considerar que os outros Deuses estão contidos neles: por exemplo, Dionizius [o Deus Cornífero invernal] em Zeus [o "Altíssimo"], Asclepius [o herói ou santo que fora profeta do Deus Dionysos e aprendeu a Bruxaria e o ofício de cura com o anjo dos irmortais Hermes] em Apollon [o Deus Apollon Paion, também chamado de Pan], as Carites [as três Fadas ou Moiras dos tempos atlantes, filhas de Naamah] em Aphrodite [a Pandemos/Syria Kale/Sarah Kali, também chamada Naamah/Ninmah]. Podemos, também, discernir as suas várias esferas: à Hestia [a Deusa Isis/Aset/Demeter Sito] pertence a terra, à Poseidon a água, à Hera o ar, à Hephaistos o fogo. E as seis esferas superiores aos Deuses aos quais são comumente atribuídas. Para Apollon e Artemis [o Deus e a Deusa, ou Casal Divino] devem ser atribuídos o Sol e a Lua, a esfera de Khronos [o honorífico 'Rei dos Druidas', o Velho Donzel ou Paráclito da Bruxaria] deve ser atribuída à Demeter [a Deusa Mãe], o éter [chama vital ou quintessência] à Atena [a arcanja intitulada Moria ou Moriae, a Virgem das Oliveiras, a Sophia/Iris], enquanto o céu é comum a todos [o Olimpo]. Assim, as ordens, poderes e esferas dos doze Deuses foram explicadas e celebradas nos hinos.

VII – Sobre a Natureza do Mundo e a sua Eternidade:

O cosmos deve ser, por necessidade, indestrutível e incriado. Indestrutível, pois, suponha que seja destruído: a única possibilidade é fazer um melhor, pior ou igual, ou então, um caos. Se pior, o poder do qual o melhor se faz o pior deve ser ruim. Se melhor, o criador que não o fez melhor antes deve ser imperfeito em poder. Se o mesmo, não haverá sentido em fazê-lo; se um caos, seria ímpio até mesmo pensar em tal coisa. Essas razões seriam suficientes para mostrar que o cosmos é, também, incriável. Tudo o que é criado está sujeito à destruição. Além disso, haja visto que o cosmos existe pela benevolência do bom, segue-se, então, que a divindade deve ser boa e o mundo existir. Assim como a luz coexiste com o Sol e com o fogo e a sombra coexiste com o corpo. Dos corpos no cosmos, alguns imitam a mente e movem-se em órbitas; alguns imitam a alma e movem-se em linha reta, fogo e ar para cima, terra e água para baixo.

Dos que movem em órbitas, a esfera fixa vai até o leste, os sete [os planetas e seus respectivos arcanjos ou regentes] para o oeste (É assim para várias causas, especialmente para que a criação não seja imperfeita, devido ao rápido circuito das esferas). O movimento sendo diferente, a natureza dos corpos deve ser, também, diferente; o corpo celestial, consequentemente, não queima ou congela o que toca, ou faz qualquer coisa que pertence aos quatro elementos. E como o cosmos é uma esfera – o zodíaco o prova – e, em cada uma dessas esferas, “para baixo” significa “em direção ao centro”, pois, o centro é a maior distância de cada ponto e as coisas pesadas “caem” para a terra. Todas essas coisas são realizadas pelos Deuses, ordenadas pela mente, movidas pela alma. Sobre os Deuses já discutimos.

VIII – Sobre a Mente e a Alma e Porque esta é Imortal:

Há uma certa força menos primária que o ser, no entanto, mais primária que a alma, que extrai sua vida do ser e completa a alma como o Sol completa a visão. Algumas das almas são racionais e imortais, algumas irracionais e mortais. As primeiras derivam dos primeiros Deuses, as segundas dos secundários. Primeiro, devemos considerar o que é a alma: é aquilo, então, pelo qual o animado se difere do inanimado. A diferença está no movimento, na sensação, na imaginação, na inteligência. A alma, portanto, quando racional, é a vida que controla os sentidos e a imaginação e usa a razão. A alma irracional depende das afeições do corpo, sente desejo e raiva irracionalmente. A alma racional, com a ajuda a razão, despreza o corpo e, lutando contra a alma irracional, produz virtude ou vício, de acordo com a sua vitória ou derrota.

Deve ser imortal, tanto por conhecer os Deuses (e nada mortal conhece o que é imortal), quanto por observar os assuntos humanos como se estivesse fora deles e, como algo incorpóreo, é afetada da forma oposta ao corpo. Enquanto o corpo é jovem e belo, a alma é oprimida e o seu vigor, diminuído; mas, quando ele envelhece, a alma revive e aumenta a sua força e vigor. E toda boa alma usa a mente, mas, nenhum corpo pode produzir mente, pois, como que aquilo que não possui mente produziria mente? Enquanto a alma usa o corpo como um instrumento, ela não está nele; assim como um engenheiro não está na sua máquina (apesar de que muitas máquinas se movem sem serem tocadas por alguém). E se alma é notoriamente feita para errar pelo corpo, não é nada espantoso, pois, as artes não são capazes de realizar o seu trabalho quando seus instrumentos não funcionam.

IX – Sobre a Providência, o Destino e a Fortuna:

Isto é o suficiente para mostrar a Providência dos Deuses. Pois, de onde vem a ordem do mundo, se não há força ordenadora? E de onde vem o fato de que todas as coisas existem por um propósito: por exemplo, a alma irracional para que haja sensação e a racional para que a terra seja posta em ordem? Mas é possível deduzir-se o mesmo resultado das evidências da Providência na natureza: por exemplo, os olhos foram feitos transparentes com uma visão para enxergar; as narinas estão acima da boca para distinguir os alimentos mal cheirosos; os dentes frontais são afiados para cortar os alimentos e os dentes posteriores são largos para moê-los.

E observamos que cada parte de cada objeto é arranjada sobre um princípio similar. É impossível que haja tanta providência nos últimos detalhes e nenhum nos primeiros princípios. Então, as artes da profecia e da cura, que são parte do cosmos, vêm da benevolente Providência dos Deuses. Todo esse cuidado pelo mundo, devemos crer, é tomado pelos Deuses sem nenhum ato de vontade ou trabalho. Como corpos que possuem algum poder, produz em efeitos por meramente existirem: por exemplo, o Salo dá luz e calor por meramente existir; por uma razão muito maior, assim, a Providência dos Deuses age sem esforço para si mesma e para o bem dos objetos de sua premeditação.

Esse fato resolve o problema dos Epicuristas, que afirmam que a divindade não tem problemas em si mesma e nem dá problema aos outros. Mas, o benéfico empenho incorpóreo dos Deuses resultando em corpos e subsistindo em corpos, é diferente do primeiro e é chamado de Destino, por que as suas séries de causas são mais visíveis em corpos; e foi por lidar com essa sorte que a ciência da astrologia ou matemática astronômica foi descoberta. Portanto, acreditar que as coisas humanas, especialmente a sua constituição material, sejam ordenadas não apenas por seres celestiais, mas, também, pelos corpos celestiais, é uma crença racional e verídica.

A razão mostra que a saúde e a doença, a boa e a má sorte, procedem de acordo com nossos merecimentos de tais fontes. Mas, atribuir os atos de injustiça e lascívia dos homens ao Destino, é tornar-nos bons e os Deuses, ruins. A não ser que, por acaso, um homem queira dizer que, no geral, todas as coisas do mundo e qualquer coisa que tenha uma substância natural são boas, mas, a má educação ou fraqueza de natureza, muda os bens do Destino para algo pior. Assim como acontece com o Sol, que sendo bom para todos, pode ser prejudicial à pessoas com oftalmia ou febre; ou porque os Povos Masságetas comem os seus pais, os Povos Hebreus praticam circuncisão e os Povos Persas preservam as suas regras de classe?

Porque os astrólogos, quando chamam Saturno e Marte de “malignos” acabam os tornando bons, atribuindo-lhes filosofia e realeza, liderança e tesouros? E, se falam de triângulos e quadrados, é absurdo que os Deuses devam mudar suas naturezas de acordo com a sua posição no espaço, enquanto a virtude humana permanece a mesma em qualquer lugar. Além disso, o fato de que as estrelas predizem uma ordem alta ou baixa para o pai da pessoa da qual o horóscopo é feito, ensina que nem sempre elas fazem as coisas acontecerem, mas, às vezes, apenas as indicam. Pois, como as coisa que precedem o nascimento poderiam depender do nascimento? Além do mais, como há a Providência e o Destino de nações e cidades e, também, de cada indivíduo, então também há a Fortuna, que deverá ser tratada em breve.

O poder dos Deuses que ordena para o bem as coisa que não são uniformes e, que ocorrem ao contrário das expectativas, é comumente chamado de Fortuna; e é por essa razão que é a Deusa especialmente cultuada em público por cidades, pois, cada cidade consiste de elementos que não são uniformes. A Fortuna tem o poder abaixo da Lua, pois, acima da Lua, nada pode acontecer por Fortuna. Se a Fortuna torna próspero um homem perverso e pobre, um homem bom, não há necessidade de se espantar. Pois, os perversos tratam a riqueza como tudo e o bem, como nada. E a boa Fortuna dos maus não pode tomar a sua maldade, enquanto que a virtude sozinha será o suficiente para os bons.

X – Sobre a Virtude e o Vício:

A doutrina da virtude e do vício depende da alma. Quando a alma irracional entra no corpo e imediatamente produz conflito e desejo, a alma racional posta em autoridade sobre todas elas, torna a alma tripartida, composta de razão, conflito e desejo. A virtude na região da razão é sabedoria, na região do conflito é coragem, na região do desejo é temperança ou equilíbrio; ao passo que a virtude de toda a alma é justiça. É pela razão julgar o que é certo, pela luta em obediência à razão desprezar as coisa que mostram-se terríveis e pelo desejo perseguir o que não é aparentemente desejável, mas, aquilo que é, com a razão, desejável. 

Quando essas coisas assim são, temos uma vida justa; pois, a justiça em matéria de propriedade, é apenas uma pequena parte da virtude. E assim encontraremos todas as quatro virtudes em homens devidamente Iniciados, mas, entre os não treinados, pode-se ser corajoso e injusto, um outro comedido e estúpido e outro, prudente e sem princípios. De fato, essas qualidades não deveriam ser chamadas virtudes quando elas são desprovidas de razão, imperfeitas e, portanto, são encontradas em seres irracionais. O vício deve ser considerado consistindo de elementos opostos: na razão é insensatez; na luta, covardia; no desejo, intemperança; e, em toda a alma, injustiça. As virtudes são produzidas pela organização social correta e pela boa criação e educação; os vícios, pelo oposto.

XI – Sobre a Organização Social Certa e Errada:

As constituições também dependem da natureza tripartida da alma. Os governantes análogos à razão, os soldados à luta, os homens comuns aos desejos. Onde todas as coisas são feitas de acordo com a razão e o melhor homem governa, constitui um reino ou reinado; onde mais do que um governa de acordo com a razão e lutam, trata-se de uma aristocracia; onde o governo estiver em conformidade com o desejo e ofícios dependem do dinheiro, consiste no que é chamada de timocracia. O contrário seria: ao reinado, tirania, pois, um reino faz todas as coisas guiadas pela razão e a tirania, nada; à aristocracia, oligarquia, quando não as melhores, mas, algumas das piores pessoas são os governantes; à timocracia, democracia, quando não os ricos, mas, os homens comuns possuem todo o poder.

XII – A Origem das Coisas Más e Porque Não Existe Mal Positivo ou Absoluto:

Se os Deuses são bons e criam todas as coisas, como que o mal existe no mundo? Ou, talvez, é melhor antes afirmar o fato de que, sendo os Deuses bons e criando todas as coisas, não há mal positivo ou absoluto, ele somente existe pela ausência do bem; assim como a própria escuridão não existe, mas, assim aparenta, com a ausência da luz. Se o mal existe, deve ser: ou nos Deuses, ou nas mentes, ou nas almas, ou nos corpos. O mal não existe em nenhuma divindade, pois, toda divindade é boa.

Se alguém afirmar que a mente é má, deve ao mesmo tempo dizer que a mente não constitui uma mente. Se alguém afirmar que o mal está na alma, ele deve conceber a alma como inferior ao corpo, pois, nenhum corpo é mau em si mesmo. Se afirmar que o mal é constituído de alma e corpo juntos, é absurdo que separadamente eles não sejam maus, mas que, juntos, criem o mal. Suponha-se que existam espíritos maus: se possuem o seu poder dos Deuses, não podem ser maus; se de outro lugar, então os Deuses não criam todas as coisas. Se os Deuses não criam todas as coisas, então: ou Eles desejam ou não podem, ou podem e não desejam; nada que seja consistente com a ideia de divindade.

Podemos ver, portanto, desses argumentos, que não há mal positivo ou absoluto no mundo. É nas atividades dos homens que o mal aparece e não de todos os homens e nem sempre. Na verdade, se os homens fizessem coisas ruins por causa do mal, a própria natureza seria má. Mas, se o adúltero pensa que o seu adultério é errado, mas, o seu prazer, bom; se o assassino pensa que o seu assassinato é ruim, mas, o dinheiro que consegue, é bom; e se o homem que faz mal a um inimigo, pensa que, fazer mal é ruim, mas que, punir seus inimigos, é bom; e se toda a alma cometer delitos ou erros desta maneira, então o mal é feito por causa do bem. (Dá mesma forma que, se não há luz em um lugar, então há escuridão, que não possui existência positiva).

Portanto, a alma produz coisas ruins porque, tentando buscar o que é bom, comete enganos sobre o que é bom, porque não é a prima causa ou essência. E vemos muitas coisas feitas pelos Deuses para preveni-la de cometer enganos e para curá-la quando os comete. Artes, ciência, execrações, orações, santos ofícios, iniciações, leis, constituições, julgamentos e punições, tudo vem à existência para prevenir que as almas caiam no erro ou falha; e quando elas partem do corpo, Deuses e daimones a purificam de todos os seus erros ou falhas.

XIII – Como as Coisas Eternas são Feitas:

Sobre os Deuses, o mundo e as coisas humanas a seguinte descrição será o suficiente para aqueles que não puderam passar por toda uma oficina ou loja de Filosofia, mas que, ainda assim, não possuem almas que não possam ser ajudadas. Resta explicar como tais objetos nunca foram feitos e não são nunca separados um do outro, pois, já dissemos acima que as substâncias secundárias foram “criadas” pelas primárias. Tudo o que é criado é construído por arte, ou por processo físico, ou de acordo com algum poder.

Mas, em arte ou natureza, o criador deve ser anterior ao que é criado: porém, o criador, conforme o poder, constitui a criação absolutamente junta a si mesmo, já que o seu poder é inseparável dela; assim como o Sol produz luz, o fogo produz calor e a neve produz frio. Mas, se o Deuses criam o mundo por arte, eles não o fazem ser, mas, fazem-no tornar uma forma particular. Pois, toda arte faz a forma do objeto. O que então o faz ser? Se tratasse de um processo físico, como, neste caso, pode o criador dar parte de si mesmo ao que é criado? Se os Deuses são incorpóreos, o mundo também o deveria ser. Se fosse dito que os Deuses são corpos, então de onde o poder das incorpóreas viria?

E se fossemos admiti-lo, então seguiria-se que o mundo decompõe e o seu criador, também, deveria se decompor, se é um criador por processo físico. Se os Deuses não criam o mundo nem por arte e nem por processo físico, só resta dizer que o criam por poder. Tudo, assim criado, subsiste junto com aquilo que possui o poder. Nem as coisas assim criadas podem ser destruídas, exceto que o poder do criador seja tomado: assim, aqueles que acreditam na destruição do cosmos, ou negam a existência dos Deuses, ou, enquanto a admitem, negam o poder dos Deuses.

Portanto, quem faz todas as coisas por seu próprio poder, faz todas as coisas subsistirem juntas a si mesmo. E como o seu poder é o maior, ele deve ser o criador não apenas dos homens e animais, mas, também, dos Deuses e dos daimones. E quanto mais longe estiver a primeira divindade da nossa natureza, mais poderes devem estar entre nós e ela [portanto, mais submissos à forças inferiores estaremos quanto mais distantes estivermos dos Deuses]. Pois, todas as coisas que estão muito distantes uma das outras possuem muitos pontos intermediários entre elas.

XIV – Em Que Sentido, Embora os Deuses Nunca Mudam, Diz-se Que se Tornam Irados e são Pacificados:

Se alguém pensa que a doutrina da imutabilidade dos Deuses é razoável e verídica e logo reflete sobre como os Deuses se alegram com coisas boas e rejeitam as más, ficam irados com aqueles que cometem más ações e tornam-se amigáveis quando são pacificados, a resposta lhe é a seguinte: Deuses não se alegram, pois, o que se alegra também se aflige; nem ficam irados, pois, ficar irado consiste numa paixão; e nem são pacificados por oferendas, pois, se fossem, seriam conquistados pelo prazer. É ímpio supor que a divindade seja afetada, positiva ou negativamente, pelas coisas humanas. Os Deuses são sempre benevolentes, sempre fazem coisas boas e nunca prejudicam, estando sempre no mesmo estado e como eles próprios.

A verdade é simplesmente esta, quando somos benevolentes, estamos juntos aos Deuses pela nossa similitude alinhada a Eles, em viver de acordo com a virtude, assim nos ligamos aos Deuses. Porém, quando nos tornamos maus, fazemos dos Deuses nossos inimigos, não porque ficam enfurecidos conosco, mas, porque nossos atos impedem que a luz dos Deuses chegue a nós e, logo, entramos em comunhão com os daimones da maldade. E se, através de orações e ofícios santificados, conseguimos libertação, não significa que agradamos ou mudamos os Deuses, mas, pelo que fazemos e por nos alinharmos em direção à divindade, curamos a nossa maldade e, assim, aproveitamos mais uma vez a benevolência dos Deuses. Dizer que os Deuses viram as costas ao mal é como afirmar que o Sol se esconde do cego.

XV – Porque Cultuamos os Deuses, Visto que Eles não Precisam de Nada:

Isso resolve a questão sobre sacrifícios e outros ritos realizados pelo povo aos Deuses. A divindade em si mesma não possui necessidades e a adoração é realizada para o nosso próprio benefício. A Providência dos Deuses chega a todo lugar e precisa apenas de determinada congruência para a sua recepção. Toda a congruência é alcançada por meio de representação e similitude com os mesmos; é por essa razão que os templos são feitos como representações dos céus, o altar da terra, as imagens da vida (motivo pelo qual são feitas de coisas vivas), as orações do que é abstrato, os caracteres místicos dos poderes celestiais inefáveis, as ervas e plantas da matéria e os sacrifícios silvestres da vida irracional que existe dentro de nós. De todas essas coisas os Deuses não ganham nada; o que uma divindade poderia ganhar? É nós que ganhamos alguma comunhão com Eles.

XVI – Sobre os Santos Ofícios e as Adorações, Porque Beneficiam os Homens e Não os Deuses:

Penso que seja importante acrescentar algumas notas sobre os santos ofícios. Em primeiro lugar, como recebemos tudo dos Deuses, e é justo e correto pagar a quem nos dá uma fração de seus dons, pagamos uma pequena fração de posses em voto de oferenda, de nossos corpos, cabelos e adornos em sacrifício de oferenda da vida. Em segundo lugar, orações sem santos ofícios são apenas palavras, ao passo que, unidos, são palavras vivas; a palavra traduz o significado da vida, enquanto que o significado da vida anima o mundo. Em terceiro lugar, a felicidade de cada objeto é a sua própria perfeição; e a perfeição para cada um é a comunhão com a sua própria causa [o Eu Superior ou Profundo, que é nosso eixo pelo qual conduzimos a roda]. Por essa razão, oramos pela comunhão com os Deuses. 

Assim, por tanto, a primeira vida é a vida dos Deuses, mas, vida humana trata-se da vida de uma espécie e esta, também, deseja a comunhão com a vida divina: um meio termo, então, é necessário, pois, as coisa que estão muito distantes não podem ter comunhão sem um meio termo e este deve ser como as coisas que se fundem juntamente; portanto, o meio termo entre a vida e a vida, deve ser a vida. É por isso que alguns homens matam animais [para se alimentar no chamado Banquete Simples, após os ritos sagrados, na velha Bruxaria]; o que, atualmente, apenas os nobres o fazem, mas, no passado, muitos o faziam, não indiscriminadamente, mas, concedendo as oferendas devidas a cada divindade, com um intenso culto de amor. Basta desse assunto.

XVII – Que o Cosmos é de Natureza Eterna:

Mostramos acima como os Deuses não “destroem” o cosmos. Ainda resta mostrar que a sua natureza é indestrutível. Tudo o que é destruído, ou é destruído por si mesmo ou por outra coisa. Se o cosmos é destruído por si mesmo, o fogo deve queimar a si mesmo e a água secar a si mesma. Se por outra coisa, deve ser ou por um corpo ou por algo incorpóreo. Por algo incorpóreo é impossível, pois, coisas incorpóreas preservam corpos, a natureza, por exemplo, e a alma, e nada é destruído por uma causa da qual a sua natureza seja preservar. Se é destruído por algum corpo, deve ser ou por aqueles que existem ou por outros.

Se por aquilo que existe: então, ou aquilo que se move em linha reta deve ser destruído por aquele que se revolve em círculo, ou vice-versa. Mas, aquilo que se revolve em círculo não possui natureza destrutiva; e não, então, por que não vemos nada destruído por essa causa? Nem mesmo aquilo que se move em linha reta pode tocar os outros; se não, porque nunca o fizeram? Mas, nem aquilo que se move em linha reta pode ser destruído por um ao outro; pois, a “destruição” de um é a criação de outro; e isso não é se destruir, mas se transformar. Mas, se o mundo é destruído por outros corpos, então é impossível dizer onde tais corpos estão ou de onde eles virão.

Mais uma vez, tudo que é destruído é destruído ou em forma ou em matéria. Forma é o formato de uma coisa, a matéria é o corpo. Mas se a forma é destruída e a matéria permanece, vemos outras coisas aparecerem. Se a matéria pode ser destruída, como que ela pode ter durado por todos esses anos? Se, quando a matéria é destruída, outra matéria toma o seu lugar, a nova matéria deve vir ou de algo que é ou de algo que não é. Se for daquilo que é, aquilo que é existe perpetuamente, então a matéria também deve ser eterna. Mas, se aquilo que é seja destrutível, então significa afirmar que tal teoria afirma que, não o mundo, mas tudo no universo é possível de ser destruído.

Se a matéria, então, advém daquilo que não é: em primeiro lugar, é impossível que qualquer coisa venha de algo que não seja; mas, suponha-se que isso aconteça e que a matéria realmente viesse daquilo que não é; então, enquanto existir coisas que não são, a matéria existirá. Pois, resumo que não possa nunca haver um fim para as coisas que não são. Se afirmam que a matéria não tem forma: em primeiro lugar, por que isso ocorre com o mundo como um todo quando não acontece com quaisquer partes? Em segundo lugar, por essa hipótese, não se destrói o ser das coisas, mas, apenas a sua beleza.

Além disso, tudo que é destruído, ou é dissolvido nos elementos do qual veio, ou desaparece no imanifestável. Se as coisas são dissolvidas nos elementos dos quais elas vieram, então haverá outros: ou então, como elas vieram a ser? Se aqui que é se dissolver em imanifestável, o que previne que isso não ocorra com os próprios Deuses? O que é absurdo. Ou, se os poderes dos Deuses previnem isso, não é uma propriedade de poder que é capaz de salvar alguma coisa, mas, apenas a si mesmo. E é igualmente impossível para que o manifestável venha do nada e se dissolva no nada. Mas, se o cosmos é destruído, deve ser ou destruído de acordo com a natureza ou contra a natureza. Contra a natureza é impossível, pois, o que é contra a natureza não é mais forte do que a natureza.

Se de acordo com a natureza, deve haver, em consequência, uma outra natureza que muda a natureza do mundo: o que não aparece. Mas, qualquer coisa que seja naturalmente destrutível podemos destruí-la por nós mesmos. Mas ninguém nunca destruiu ou alterou a esfera do cosmos. E os elementos, apensar de que podem ser transformados, não podem ser destruídos. Assim, tudo que é destrutível é também transformado pelo tempo e envelhece. Mas, o cosmos através de todos esses anos permaneceu inalterado. Tendo dito tanto para o auxílio daqueles que se sentem na necessidade de uma explicação que seja suficientemente plausível, eu mesmo oro ao próprio mundo para que seja abençoado.

XVIII – Por Que Existem Rejeições aos Deuses e Por Que Eles Não se Ofendem:

O fato de que as rejeições aos Deuses aconteceram em determinadas partes da terra e, muitas vezes, acontecerão no futuro, perturba a mente dos Sábios: tanto porque coisas deste tipo não afetam os Deuses, assim como vimos que cultos não os beneficiam; e porque a alma, sendo de essência intermediária, nem sempre pode estar correta; quanto por causa de todo o mundo não ter o poder para desfrutar igualmente da Providência dos Deuses, mas, algumas partes podem tomar parte dela eternamente, outras às vezes e, outras ainda, de forma primária ou secundária. Assim como o cérebro percebe todos os sentidos, mas o resto do corpo percebe poucos. Por esta razão, ao que parece, aqueles que estabeleceram festivais também estabeleceram dias proibidos, nos quais alguns tempos ficam fora de funcionamento, outros são fechados e, outros ainda, têm os seus adornos removidos, em expiação da fraqueza de nossa natureza. Não é improvável, também, que a rejeição aos Deuses seja um tipo de punição: podemos muito bem acreditar que, aqueles que conhecem os Deuses e nunca os negaram em uma vida, podem ser privados do seu conhecimento completo na vida seguinte. Além do mais, aqueles que veneraram os seus próprios reis como “deuses” merecem como punição a perda de todo o seu conhecimento sobre os Deuses.

XIX – Porque os Transgressores Não São Punidos de Imediato:

Não há necessidade de surpreender-se se alguns atos não trazem punição imediata a quem os comete. Pois, não são apenas os daimones que punem a maldade, mas, a alma se põe em julgamento [devido à justiça em que está submersa no seu íntimo]. E também não é correto que, aqueles que devam sofrer durante longo tempo pela gravidade de seus erros, sejam punidos por um curto período: além disso, é preciso virtude dos humanos. Se as transgressões fossem punidas imediatamente, os homens agiriam apenas por medo ou limitações e não teriam virtudes. As almas geralmente são punidas quando deixam o corpo, algumas vagam entre nós, outras vão para lugares frios da terra e, outras ainda, são perturbadas por daimones. Sob todas as circunstâncias, elas sofrem com a parte irracional de sua natureza, com a qual cometeram maus atos. Por isso que subsiste um corpo sombrio que é visto pelos adros, especialmente aqueles que viveram uma vida de abandono.

XX – Sobre a Metempsicose e suas Palingenesias em Naturezas Irracionais:

Quando a metempsicose acontece em um ser racional, ela simplesmente se torna a alma daquele corpo. Mas, se alma palingenesia para um animal silvestre, ela segue a natureza do corpo externo, como um daemon guardião que segue um ser. Pois uma alma racional não poderia nunca estar em um ser irracional. A metempsicose pode ser provada pelas aflições congênitas das pessoas. Pelo fato de alguns humanos nascerem cegos, outros paralíticos, outros com alguma doença na própria alma ou persona? Logo, é o dever natural das almas fazer o seu trabalho no corpo; deveríamos supor então que, assim que estas almas deixam um corpo, deveriam viver toda a eternidade de forma errante ou inútil? Se as almas não entrassem mais uma vez em corpos, elas deveriam ou ser infinitas em números ou os Deuses deveriam produzir novas continuamente. Mas, não há nada infinito na natureza; pois, em um todo finito, não se pode ter uma parte infinita. Nem outras podem ser feitas; pois, para tudo o que for novo possa, antes, ser criado deve ser imperfeito. E o cosmos, sendo criado por um autor perfeito, deve ser comumente perfeito.

XXI – Que os Bons, Vivos ou Mortos, são Felizes:

As almas que viveram em virtude são geralmente felizes ou alegres e, quando separadas da parte irracional de sua natureza e purificadas de toda a matéria, alcançam a comunhão com os Deuses e unem-se a Eles para governarem o mundo, junto às divindades ou gênios dos quais foram criadas. Mas, mesmo que nada do tipo possa ocorrer à alma, a própria virtude, a alegria ou felicidade e a exaltação da virtude e a vida que não estão sujeitas à qualquer ser controlador ou servidão, são o suficiente para tornar feliz a alma daquele que buscou viver de acordo com a virtude ou excelência e a conseguiu.



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Ao benemérito St. Prior J.'.E.'.C.'.S.'.
Pela divindade do Uno, do Deus e da Deusa,
Ao Filho Divino, Vida, Saúde, Força e União!

Três Vezes Abençoado.