sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

-A Iniciação de Lucius Apuleios

{Lucius Apuleios era um romano humilde, da cidade de Madaura, que gastou todos os bens que possuía em viagens aos antigos distritos que possuíam Clãs de Bruxas para aprender o conhecimento antigo, assim como também fizeram Socrates e Pythagoras no Antigo Egito, na Caldeia e nas antigas ilhas gregas. Em Roma, Lucius Apuleios vendeu suas próprias roupas para pagar as despesas dos ritos de Iniciação ao sacerdócio da Deusa Estelar e do Deus Cornífero, tornando-se iniciado no Clã Isíaco-osiriano e  depois de passar pela Tessália, pátria famosa por seus Bruxos metidos à feiticeiros  no Clã Platônico, onde fazia manifestar os Deuses em si mesmo. Nesses impasses, Lucius Apuleios relatou sua Iniciação na Bruxaria, o que, por sua vez, influenciou Guglielma e Mayfreda na restauração da Bruxaria na Itália medieval e o surgimento do texto "O Encargo de Aradia" ou, na versão gardneriana, "O Encargo da Deusa" (expomos-o no tópico da galeria: "Quem foi 'Aradia' da Toscana?"). Tais relatos da iniciação de Lucius Apuleios, apresentam-se a seguir}.


FONTE: "A Metamorfose"

Autor: Lucius Apuleios

Na primeira noite de vigília, quando já dormira meu primeiro sono, acordei com súbito pânico e vi a lua brilhar tão clara, como quando está cheia, e parecendo que havia saído do mar. Então pensei comigo mesmo que esta era a hora mais secreta, quando aquela Deusa tinha mais pujança e poder, considerando que todas as coisas mortais são regidas por sua determinação; e que não apenas todos os bichos domésticos e domados, silvestres e selvagens podem tornar-se fortes mediante o regência de sua luz e natureza divina, mas, também, as coisas inanimadas e sem vida; e considerei que todos os corpos nos céus, na terra e nos mares aumentam pelo seu movimento crescente e diminuem pelo seu movimento decrescente; então, muito esgotado de minha sorte cruel e calamidade, encontrei esperança e cura soberana, mesmo sendo muito tarde para ser liberado da miséria, pela invocação e oração à beleza inigualável dessa poderosa Deusa. 

Por isso, sacudindo minha sonolência, levantei com rosto jubiloso e fui com grande afeição purificar-me, mergulhando a cabeça sete vezes na água do mar; o número sete é conveniente e de acordo com todas as coisas divinas, como o valioso e sábio Pythagoras ensinou. Então, muito vivaz e feliz, embora com a expressão emocionada, fiz essa oração à Deusa poderosa:

‘Oh abençoada Rainha dos Céus, sejas Tu Senhora Ceres, Mãe e fonte primordial de tudo que frutifica sobre a terra, que, depois de encontrar Tua filha Proserpina, pela grande alegria concebida, aboliste terminantemente todo alimento do tempo antigo, o fruto do carvalho, e tornaste a estéril e infrutífera terra de Elêusis arável, e agora destes aos mortais a possibilidade de plantar um alimento melhor e mais suave; ou se fores a Venus Urania, que no início do mundo juntou macho e fêmea com um amor procriador e assim criastes a propagação eterna das raças de seres, sendo agora adorada dentro dos Templos da Ilha de Pafos; ou se fores a irmã do Deus Pheobos, que tanta gente salvou, aliviando e neutralizando com Teus elixires as aflições do trabalho árduo e da arte, agora adorados nos lugares sagrados de Éfeso; ou se Te chamares terrível Proserpina, por causa dos gritos mortais que permites, que tem o poder triplo de impedir e eliminar a invasão de feiticeiros e fantasmas que aparecem para os mortais e de mantê-los lá embaixo, nos abismos da terra, que vagueia pelos bosques e é adorada de diversas maneiras; Tu, que iluminas todos os lugarejos da terra com Tua luz feminina, Tu que nutres todas as sementes do mundo com Tua cálida umidade, doando Tua luz plena conforme os movimentos, próxima ou distante do sol; qualquer que seja o nome, o modo ou a forma legítima de Te chamar, clamo a Ti para que acabe com a grande e árdua escravidão e eleve minhas esperanças perdidas, liberando-me desta sorte fútil que há tanto tempo me controla. Concede paz e descanso aos meus sofrimentos, se Te agrada, pois tenho suportado trabalhos e perigos suficientes...’

Quando acabei esta oração, expondo meus pedidos à Deusa, sucedeu de cair no sono sobre a mesma cama; e aos poucos, pois recém havia fechado os olhos, apareceu para mim, da bruma do mar, um rosto divino e venerável, adorado até mesmo pelos próprios Deuses. Então, pouco a pouco, eu parecia ver toda a imagem de seu corpo, elevando-se luminosamente do mar e parando diante de mim; daí eu me proponho a descrever sua aparência divina, se é que a pobreza do meu discurso humano permite ou se o poder divino me der o dom de eloquência suficientemente nobre para expressá-la. 

Primeiramente, Ela tinha grande abundância de cabelo, fluindo e encaracolado, disperso e espalhado por seu divino pescoço; no alto da cabeça, trazia muitas guirlandas entrelaçadas com flores, e no meio da testa havia um círculo de espelho, ou melhor, parecia a lua, pela luz que projetava; e isso era sustentado em ambos os lados por serpentes que pareciam se erguer dos sulcos da terra, e acima havia folhas de milho. Sua veste era do mais puro linho e produzia várias cores; em alguns lugares era brilhante e branca, em outros, amarela como a flor de açafrão, em outros, vermelho-róseo, em outros, flamejante; e seu manto, que transformou minha visão e meu espírito entusiasmado, era absolutamente escuro e coberto com um brilho negro, enrolando-se à sua volta, passava por baixo do braço esquerdo e ia por cima do ombro direito, como se fosse um escudo, e parte dele caía, drapeado de modo sutil, ao longo das saias da vestimenta, deixando que as bordas aparecessem graciosamente. 

Aqui e acolá, sobre a margem e por toda a superfície, as estrelas reluziam, entre elas a meia-lua, que brilhava como chama de fogo; e em volta de toda a borda daquela belíssima roupagem havia uma coroa entrelaçada, sem falhas, com todas as flores e os frutos. Ela exibia coisas bastante diversas; em sua mão direita um sistro, um arco achatado atravessado horizontalmente por pequenas hastes metálicas, que ao movimento de seu braço emitiam uma melodia nítida e aguda. Na mão esquerda, segurava um cálice de ouro, como se fosse um barco, cuja alça, na parte de cima, que pode ser melhor vista, trazia a cabeça elevada de uma serpente com a garganta larga e aberta. Seus pés perfumados eram cobertos com sapatos entrelaçados por palmas da vitória. Assim, a forma divina exalava os aromas agradáveis da fértil Arábia e dignou-se, com sua voz sagrada, a proferir estas palavras à mim:

Vê, Lucius, eis-me aqui! Teu pranto e orações moveram-me a socorrer-te. Sou aquela que é a mãe natural de todas as coisas, rainha do céu! Sou a principal entre os deuses celestiais, a luz dos deuses e deusas. À minha vontade ordenam-se os astros dos céus, todos os ventos dos mares e os silêncios dos Infernos. Meu nome e minha divindade são adorados conforme vários costumes e sob muitos nomes. Os frígios chamam-me a Mãe dos Deuses. Os atenienses, Minerva. Os ciprianos, Vênus Urânia. Os cretenses, Diana. Os sicilianos, Proserpina. Os eleusínios, Ceres. Alguns chamam-me Juno, outros Bellona, e ainda outros, Hécate. E os etíopes sobretudo, que no Oriente habitam, e os egípcios, que são excelentes em toda espécie de ensinamento antigo e por suas cerimônias adequadas estão acostumados a cultuar-me, chamam-me por Rainha Ísis.

Vê, vim para compadecer-me de teu infortúnio e tribulação. Vê, fiz-me presente para favorecer-te e ajudar-te. Deixa tuas lágrimas e lamentos, afasta tua tristeza. Percebe, pois, que o dia determinado por minha providência acaba de chegar. Portanto, que estejas pronto para atender meu comando. O dia que chegará depois desta noite está consagrado ao meu serviço por uma religião eterna. Meus sacerdotes e ministros costumam, depois de cessar as tempestades marítimas, oferecer em meu nome um novo navio como primícias de minha navegação. Ordeno-te não profanares ou desprezares o sacrifício de qualquer forma.

Ao seguir a procissão, o grande sacerdote nesse dia levará, por minha exortação, um colar ou guirlanda de rosas junto ao sistro em sua mão direita. Segue tu entre o povo a minha procissão e, quando te aproximares do sacerdote, faze como se fosses beijar sua mão. Mas abocanha as rosas, pois assim descartarei o couro e a forma de um asno. Essa espécie de animal é-me de há muito abominável e desprezível. Porém, acima de tudo, cuida para não duvidares ou demonstrares temor dessas coisas como sendo duras e difíceis de suportar. Pois, no mesmo momento em que vim a ti, ordenei ao meu sacerdote, numa visão, o que deverá fazer. E todas as pessoas, por minha ordem, serão obrigadas a dar-te lugar e nada dizer! Além disso, penso que, entre cerimônias tão belas e alegres e em tão boa companhia, qualquer pessoa detestará tua figura mal-favorecida e deformada, ou que qualquer homem não será atrevido o bastante para culpar-te e reprovar tua súbita restauração à forma humana. Sobre tal transformação não formularão qualquer sombrio conceito.

E toma isto por certo: pelo resto de tua vida, até a hora da morte, estarás ligado e servirá a mim! E não acredites ser um mal ficar ao meu sacerdócio, eis que por meus recursos e benefício tornar-te-ás imortal. Abençoado viverás neste mundo, por minha orientação e proteção viverás gloriosamente. E, quando desceres aos Infernos, hás de ver-me refulgir naquele subterrâneo reino, brilhando, como agora me vês, na escuridão do rio Aqueronte, reinando na profundeza abissal do Estige, habitando os próprios Campos Elíseos. Ali me adorarás como a alguém que te foi generosa. E, se eu perceber que foste dedicado ao meu comando, zeloso em meu ministério e digno de minha graça divina, fica ciente de que prolongarei teus dias imortais além do tempo que te foi apontado pelos fados e ordenado pelos astros celestiais.”


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Ao benemérito St. Prior J.'.E.'.C.'.S.'.
Pela divindade do Uno, do Deus e da Deusa,
Ao Filho Divino, Vida, Saúde, Força e União!

Três Vezes Abençoado.